Não falta bibliografia especializada sobre falar em público e preparar entrevistas.
O meu objetivo é simplesmente um exercício de reflexão.
O Futebol, como um todo, beneficia do aperfeiçoamento e competência dos diversos intervenientes. Tem sido assim e assim continuará, pois quer a genialidade quer o talento são impossíveis de limitar.
Contudo, já todos vimos muito talento ser desperdiçado de forma gratuita e evitável.
Hoje, vou tentar refletir sobre o contributo das entrevistas/conferências dos treinadores (antes ou depois dos jogos).
O treinador é uma personagem que se destaca, um líder, e tudo o que publicamente afirma acaba sempre por ter influência no seu desempenho: quer para o clube, a equipa, os adeptos, quer para os adversários e o futebol em geral.
Declarações impreparadas, confusas ou contraditórias, podem prejudicar bastante.
Certamente que há quem domine melhor a capacidade de comunicação com a imprensa. Mas, mesmo que com algum esforço, mudar é a atitude inteligente, sempre que nos permite optimizar capacidades, discernimento e competências.
Saber estar e agir em todos os momentos é uma qualificação importante para quem lidera e pretende viver com emoção, evitando momentos penalizadores.
Há quem fale muito e quem fale pouco…nem sempre acertadamente.
Por vezes, uns perdem-se no exagero dos argumentos e na tentativa de explicarem pormenorizadamente. Outras vezes, o bom senso não teve tempo para controlar a emoção (sempre em gaus muito elevados, sem espaço para respirar e difíceis de estabilizar).
Factos laterais ao jogo são hipervalorizados assim como eventuais falhas repetidas ao exagero, em grande parte por interesses mediáticos, sem pensarem nas consequências (para o autor e nunca para o provocador) de uma frase menos cuidada e muito facilitada.
Manter o equilíbrio é essencial. Sempre ouvi dizer que para responder a uma questão, num momento tão delicado como o dessas entrevistas (nas quais não há tempo nem oportunidade para se preparar), antes de responder a uma questão se devem colocar três pontos: O que “ele” pretende que eu diga? O que “eu” lhe quero dizer? De que forma “eu” vou dizer isso?
Há ainda a estratégia sempre útil de colocar a pergunta ao próprio entrevistador: O que acha disso? Por que me pergunta isso?
Não se trata de receitas mas de sugestão para um plano prévio que reforce a coerência, a segurança e a estabilidade emocional.
Vale a pena não descurar essa área não só para o treinador se qualificar e preparar para os diversos “jogos” mas também para contribuir com elementos que ajudem a esclarecer a forma de conhecer o jogo, permitindo a quem vê e ouve novas possibilidades para começar a “entender” o futebol, de forma mais adequada.
Assumir valores, manter atitudes que defendam o grupo, a equipa, o clube, não necessita de afirmações levianas que se voltam contra os próprios grupos.
Todos recordamos situações cruciais que originaram perdas de títulos (minuto 92, provocações não respondidas, exagero de confiança, egocentrismo extremado de tal forma que os jogadores são colocados em plano secundário…e muitos outros episódios semelhantes).
Quanto talento como treinador, quanto mérito e trabalho desenvolvido com grande qualidade, se perde como o peixe: “pela boca”.
O futebol é para alguns autores “uma guerra simbólica e controlada”, logo perder o controlo é entrar num domínio de risco e de imprevisibilidade.
Falar do que se sabe, com segurança, sem apressar discurso, provoca em quem ouve um reconhecimento de competência e de liderança que ultrapassa divergências ou simpatias clubísticas.
Entrevistas não se “ganham no grito”, na boçalidade, nem na imitação de modelos internacionais…Imitações “pagam-se caro.”
Algumas vezes o humor, quando inteligente e oportuno, permite superar pressões, momentos mais complexos e uma aceitação geral, porque não ofensivo.
Quando numa equipa, um elemento está menos bem, é necessário criar um envolvimento favorável, revelar competência e clareza de ideias sem amesquinhar ninguém.
Quem ri hoje, amanhã escarnece e depois ridiculariza.
Assim, apesar de constituir um pequeno momento, a entrevista ao treinador deve ser encarada como mais uma das muitas e bem importantes áreas de intervenção a dominar.
Escolher um modelo de comunicação consistente, verdadeiro, contribui certamente para o desenvolvimento do futebol.
“Mind Games”, provocações, grosseria, tratamento por tu, tentar sem segurança responder em outros idiomas (exigir intérprete nunca é sinal de fraqueza mas de personalidade), lançar frases desconexas, sem ligação nem intenção racionais, não representam nada de importante para o futebol, antes pelo contrário.
Mas claro, vão sempre existir momentos imponderáveis, provocatórios, injustos, intoleráveis, que ultrapassam tudo e que são potenciadores de desequilíbrios, as chamadas exceções.
Para essas, a resposta pronta, curta e excepcional…à altura das circunstâncias.