
“Sei que era o Grupo C, mas foi ao ganhar o Grupo C em Portugal, que a França iniciou o caminho que os levou onde estão hoje no andebol internacional, não faríamos tanto, óbvio, mas podíamos ter ido bem mais longe…”
As palavras são de Carlos Silva, antigo guarda-redes da Seleção Nacional que, aquando do artigo sobre a vitória no Campeonato do Mundo do Grupo C de 1976, fez também referência ao trajeto da França quando, também em Portugal mas em 1986, se sagrou campeã do mundo desta espécie de 3ª divisão europeia, mas que no entanto se revelou como tónico para a ascensão do andebol francês.
Na presente temporada, a França “colocou” três equipas na Final 4 da Liga dos Campeões e duas na final da prova, sendo que o Montpellier HB venceu a competição pela segunda vez na sua história que ao mesmo tempo se trata da segunda vez que uma equipa francesa se tornou campeã da Europa. Este sucesso deve-se também ao facto do campeonato francês se ter tornado também ele bastante competitivo, ultrapassando claramente em termos qualitativos a Liga ASOBAL (Espanha) e colocando-se ao lado da Bundesliga (Alemanha).
Um claro sinal disso mesmo é o regresso ou a continuidade de praticamente todos os principais jogadores franceses ao / no seu país. Basta recuar uns 5 / 6 anos para vermos que as principais referências do andebol francês jogavam fora de França, nomeadamente em Espanha e na Alemanha. Com o aparecimento do multimilionário PSG e com o crescimento de outros clubes como o Montpellier HB, o HC Nantes ou até mesmo o St. Raphael, os jogadores de Seleção foram regressando a França e os novos talentos vão-se mantendo por lá na sua grande maioria.
Outro sinal do crescimento do Andebol em França foi dado com a organização do último Campeonato do Mundo em 2017, naquele que foi em termos mediáticos e organizativos o mais espetacular da história (rever artigo aqui). O povo francês não ficou indiferente ao acontecimento e envolveu-se em massa, não só no apoio aos “Les Bleus”, mas também a toda a competição, enchendo os pavilhões e até mesmo um estádio de futebol com assistências de 18.000 e 28.000 espetadores, respetivamente.
O andebol francês já era grande em termos de talentos para a modalidade, basta recordar nomes como Jackson Richardson, Bertrand Gilles, Joel Abati ou os ainda em atividade Nikola Karabatic, Thierry Omayer, Daniel Narcisse ou Luc Abalo, que ao longo dos últimos 25 anos conquistaram em termos de seleções 6 Campeonatos do Mundo (mais uma medalha de prata e três de bronze), 3 Campeonatos da Europa (mais dois bronzes), 2 Medalhas de Ouro em Jogos Olímpicos (mais uma de prata e uma de bronze), só fazendo alusão aos êxitos da seleção principal masculina.
Este contínuo sucesso ao nível das seleções foi criando raízes em França o que provocou um aumento exponencial no número de praticantes, aumento este que se reflete também nos dias que correm à qualidade da Starligue (liga francesa) que, na minha opinião, é atualmente a mais atrativa do mundo.
Voltando à reflexão de Carlos Silva questiono… até onde Portugal poderia ir caso se tivesse dado uma continuidade de crescimento sustentável com a conquista do Campeonato do Mundo de Grupo C em 1976 e os êxitos organizativos de dois Campeonatos do Mundo de Grupo C (1976 e 1986 – o tal que a França ganhou), do Campeonato da Europa de 1994 (o primeiro de sempre) e do Campeonato do Mundo de 2003?
Foto: EHF